A BELA LIGÚRIA E O TURISMO GRAVETO
Dúzias de deslocações intra-europa , apesar de se traduzirem por viagens curtas que não excedem no máximo as três horas de avião começam a tornar-se tão repetitivas quanto maçadoras, não a viagem em si mas os apêndices ao trajeto principal , cem quilómetros para atingir o cais de Pedras Rubras ou os duzentos de Orio al Sério a Milão e á Ligúria, verdadeiramente á Bela Ligúria. A região é das mais pequenas da península itálica, mas não deixa de ser das mais belas, uns quilómetros de costa mediterrânica entre Monte Carlo e Pisa, com locais como S.Remo, Albenga, Noli, Génova , as pérolas de Santa Margarita e Portofino , Sestri Levante e as Cinco Terras, esse soberbo património humano e ambiental hoje quase tão invadido como a famosa torre de Pisa ou a Santa Maria della Grazie de Florença.
De facto, se há quinze anos podia meter-me no comboio regional e visitar o património aldeia após aldeia com comodidade, hoje tenho que reservar o bilhete no comboio especial que faz em continuo o Génova Cinco Terras e volta , incluindo a entrada e o percurso pedestre entre as escarpas penduradas nos Apeninos lígures donde se abarca toda a beleza duma chegada genuína a cada povoação. Verdadeiras joias da arte na transformação do ambiente duro e hostil em paraíso que leva milhões de visitantes aos vários patamares onde se amontoam pescadores que não ultrapassam os cinco mil habitantes. Uma mistura onde estes ficam a perder ante os dois milhões e meio de turistas que ali chegam todos os anos e que as entidades monitorizam para controle, defesa e viabilidade do património do parque. Mais abaixo, na linha costeira recortada por angras e enseadas um mar sereno e límpido esconde os pequenos cais onde aportam os barcos, as únicas entradas que, juntamente com o caminho de ferro que túnel após túnel perfura os Apeninos, dão acesso a cada povoação. Comboio e barco, barcos que partindo do porto de Génova, do porticello de Nervi, do pesqueiro de Camogli , Sestri ou Lavagna , atingem as cinco aldeias do percurso e que mediante um único bilhete nos dão total liberdade para entrar e sair onde nos aprouver oferecendo ao visitante a segurança e liberdade para se deslocar.
Eu, que participei alguns anos na gestão dos nossos modestos recursos turísticos e durante a vida convivi com a indústria da terra onde nasci, tenho hoje muita dificuldade em compreender e falar do nosso turismo ,não por serem recursos diminutos quase insignificantes em relação ao continente europeu onde esta zona se insere, a Riviera italiana, mas pela forma displicente, leviana, demagógica e irresponsável com que são tratados e entregues sem qualquer noção do seu valor á anárquica gestão das autarquias , de todo incompetentes nesta área de importância vital para o país.
Políticos que hoje, na sua impreparação para gestores, querem abarcar funções dum primeiro ministro dentro das suas cidades paróquia e para quem o turismo é a festa de S. Torcato lá da terra que já absorveram pelo orçamento da “cambra”. Um circo de ingénuas mordomias mais para chorar que para rir. Abandonada duma forma cega e muda por meia dúzia de “tachos” à moda antiga, a economia turística foi arredada dos governos por conta das redes de partidos mata borrão e não de profissionais competentes e acabou-se com o ministro da tutela numa atividade que, mesmo pessimamente gerida e abandonada pelo Estado, contribui com a maior parte das divisas que este país arrecada todos os anos, de longe a mais rentável industria nacional que urge sustentar, incentivar , qualificar e aumentar.
Num pobre Portugal isolado no penúltimo lugar da miséria europeia a vinte e oito e que deve á conjuntura da moda destes últimos anos o crescimento do sector do turismo e por consequência o ganho de alguma credibilidade perante os 128% do estrondoso rácio divida / pib, o que se faz??? Aliena-se a gestão pelas capelas, sem estratégia, sem rumo, sem objetivos, sem resultados sem rigor, ao deus dará de autarquias que só pensam em festas para “animar” a malta que lhe há-de pôr os votos na urna como as galinhas dão ovos. E a verdade é que um país não é exatamente a capoeira dos futebóis, mas um acerbo sério de todo o cidadão que precisa de sobreviver e viver fora do chapéu milionário da política e dos políticos.
Ora, além do absurdo e loucura desta aberração , caminhamos absolutamente no sentido contrário do que me parece devia ser feito, o não destruir estruturas já experimentadas e experientes por anos sucessivos de assimilação, cruciais e indispensáveis na sustentação do país e de estratégias urgentes em tempo e objetivos definidos na senda de melhorar os meios e nunca anarquizar a gestão entregando a trezentos e poucos reis mangas de alpaca as trezentas e tais definições do que seja o turismo e o turista. Não é com ralés partidárias, imunidades e compadrios donde fogem os cidadãos honestos e melhores qualificados que se reconstrói um país. E na área do turismo pela sua importância , peso na economia e potencialidades deveria manter-se uma estrutura de nível nacional capaz de fazer uma gestão nacional de proximidade com estratégias, objetivos , com rigor e com flexibilidade para se poder alterar a cirurgicamente o que for preciso mudar. Um ministério apostado estrategicamente com profissionais capacitados, gente criativa, inteligência e vontade de erguer um sector com grandes potencialidades nos tempos que decorrem. Deixar este trabalho nas mãos de autarquias requentadas em asneiras e vícios vai ser estagnar no campo do turismo desbaratando oportunidades permanentes de criação de riqueza. O turismo não é o S.Torcato lá da terra nem a panaceia para tudo e qualquer coisa. Nem são as galinhas dos ovos de ouro ou o património da Unesco que constroem as vias do turismo. Estas, podem abrir caminhos, proporcionar ocasiões, criar oportunidades, mas cabe ao homem, ao seu trabalho, á sua seriedade, á sua honestidade, sabedoria, profissionalismo e sentido do dever, o levar o sonho em frente. Sem as traficâncias e armadilhas dum regime que se deixou adormecer na vida fácil de políticos incapazes, apostados nas suas reformas milionárias e em festejar o imaginário pródigo e próximo que nos levou á ruína em que estamos.
Se as Cinque Terre que conheci há quinze anos fossem pelos caminhos dos compadres, dos padrinhos e das máfias partidárias, não estariam na via acelerada dos três milhões de turistas que não duplicam num ano porque se quer sustentada a economia das pessoas e manter vivo o parque respectivo. Em nada comparável ao nosso anedotário nacional. Por isso sinto sempre dificuldades em fazer comparações porque na maior parte das vezes nada há a comparar!
Nervi,Ligúria, Itália,2018
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